Persistência inflacionária — Uma breve análise comparativa entre países
Neste curto post sobre conjuntura, aproveito o ambiente de preços altos no Brasil e no resto do mundo, mais as incessantes dúvidas sobre o futuro da inflação, para discutir sobre a persistência dos choques na inflação brasileira comparada com a de alguns outros países.
Para ilustrar melhor o que rigidez de preços significa, podemos exemplificar com o caso recente do encarecimento das tarifas de energia elétrica no Brasil. Em virtude de uma queda no volume de chuvas e portanto da água nos reservatórios das usinas hidrelétricas brasileiras, a ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) determinou aumentos nas tarifas de luz do país para remunerar o acionamento das usinas termoelétricas, que suplementam a oferta de energia a um custo maior. Tal fenômeno caracteriza um choque inflacionário, oriundo do aumento das tarifas de luz, e de persistência da inflação, oriundo do tempo que toma para que o choque seja repassado aos demais custos da economia.
É possível também exemplificar a persistência inflacionária a partir de outras razões, como por exemplo na atuação da política monetária. Um banco central bastante agressivo, que atua com alta velocidade em uma aceleração da inflação, pode contribuir para reduzir uma maior persistência dos choques inflacionários a partir de uma expectativa de inflação mais próxima da sua meta.
Fiquemos nesses dois exemplos e vamos para uma generalização formal. Dentro de suas diversas formulações, a rigidez de preços pode ser definida de maneira simples como o tempo médio requerido para que a inflação volte ao seu comportamento normal após sofrer um choque adverso inesperado. Alternativamente, podemos pensar na rigidez como o “peso” que a inflação passada tem sobre a inflação futura. Na tentativa de medir este efeito, vamos explorar essa segunda definição em um breve exercício numérico.
Para nossa análise, precisamos primeiro decidir que seria um choque inflacionário. Considerarei choque tudo aquilo que é uma surpresa de inflação realizada menos aquilo que foi previsto no mês imediatamente anterior:
Para nossas medidas de inflação e expectativa de inflação, vamos usar os índices de preços oficiais com ajustes sazonais e compará-los com as expectativas de inflação da pesquisa Focus para os doze meses imeditamente subsequentes, mensalizando-as. No Brasil, o índice oficial de preços é o IPCA, e seu gráfico fica dessa forma:
Definidos os choques inflacionários e dispondo dos dados para seis outros países (Estados Unidos, Turquia, Colômbia, Chile, Peru e México), vamos especificar um modelo econométrico que captura o peso da inflação passada (com seu choque) na inflação corrente. O modelo fica assim:
Para compararmos os coeficientes β encontrados, plotei o seguinte gráfico:
Podemos interpretar o resultado da seguinte forma. Primeiro, todos os choques inflacionários possuem algum grau significante de persistência. Segundo, nos Estados Unidos a inflação tende a ser um pouco mais dependente do seu passado, enquanto no México o passado pesa menos no futuro. Importante destacar que o intervalo de confiança de 95% não nos permitiu diferenciar estatisticamente estes coeficientes apesar das diferenças em seus coeficientes centrais.
Um coeficiente central próximo de 0.5, caso do Brasil, Estados Unidos e Colômbia, significa que a meia-vida de um choque inflacionário é de um mês em média, levando cerca de 30 dias para que um choque observado perca metade do seu efeito na inflação do mês seguinte, e assim por diante. As razões para estes países apresentarem tal resultado podem ser inúmeras, não necessariamente comuns, e podem ter mudado ao longo do tempo. Cabe entender portanto quais são as origens dos choques inflacionários em cada um destes países, imaginar um momento no qual estes choques cheguem ao fim e a aplicar ao fim desses choques o coeficiente de persistência da inflação mensal nos períodos subsequentes.
Este é o post.