Econometria de séries de tempo — estudando a partir de aplicacoes em ambientes controlados (parte final)
Nesta entrada no blog, pretendo encerrar a série dos dois últimos textos postados aqui, onde simulamos aleatoriamente dois países que possuem uma relacao específica e usamos de especificacoes econométricas para “desvendar” tais relacoes de forma satisfatória em uma infraestrutura de equacao única. Se voce chegou agora, recomendo passar pelas partes 1 e 2 primeiro, para entender o contexto e a motivacao por trás destas postagens.
Relembrando onde paramos, exploramos uma ideia de dois países fictícios, Atlantida e Conchinchina, onde o segundo possui forte relacao exógena e de longo prazo com Atlantida.
Na primeira parte, experimentamos uma primeira especificacao econométrica, essa de livro texto, e enxergamos com gráficos a razao desta, apesar de bem especificada, falhar em capturar uma relacao de longo prazo que definimos mas ficou faltando. Nosso modelo MQO simples nos provia uma projecao onde o PIB da Conchinchina divergia ao longo do tempo em relacao a Atlantida.
Na segunda parte, encontramos uma forma de representar dinamicas de curto e longo prazo com modelos de regressao em nível com lags. Regressoes com lag dificultam em parte a interpretacao estatistica dos testes de correlacao entre as variáveis, em razao destas possuírem tendencia, mas de forma alguma nos impede de faze-la. Pincelamos rapidamente pela questao da cointegracao entre as variáveis, e como sua presenca era o que nos permitia usufruir de tal modelo. No texto de hoje, a cointegracao e um pouco de álgebra será o elo que permite a uniao entre as relacoes de curto e longo prazo em um modelo econométrico de equacao única.
Vamos comecar este novo modelo do último modelo que usamos e analisamos na parte 2, o modelo ARDL(1,1):
Para chegarmos onde queremos chegar, vamos fazer algumas manipulacoes algébricas simples neste modelo, conforme abaixo:
Na parte dois, deduzimos os coeficientes de longo prazo do nosso modelo ARDL(1,1), da seguinte forma:
O leitor pode nao ter percebido, mas nesta manipulacao algébrica deduzimos o que é conhecido como um modelo de correcao de erros (ECM). Este modelo é bastante popular na sintetizacao de relacoes exógenas de curto e longo prazo entre variáveis, além de eliminar alguma parte das dificuldades de identificacao estatística que possuíamos no modelo ARDL anterior, por se tratar de uma regressao final em primeira diferenca.
Para implementar este modelo, podemos simplesmente assumir que a relacao entre os coeficientes em nível y e x é:
Assim, estimamos uma primeira equacao, que mede os coeficientes de longo prazo do nosso modelo.
De posse deste modelo, usaremos o resíduos w da regressão com uma defasagem, uma vez que sabemos que este resíduo é exatamente o termo de longo prazo:
Podemos entao regredir a equacao acima com a simples especificacao:
Ao extrairmos os resíduos da primeira regressao para a segunda regressao, agora em um modelo em primeira diferenca, temos:
O output do modelo, conforme veremos, é basicamente um espelho dos resultados do modelo ARDL, uma vez que se trata basicamente de uma manipulacao algébrica de coeficientes estatisticamente identicos. Para facilitar a visualizacao, plotei os dois resíduos em conjunto no gráfico abaixo. Eles ficam quase que completamente sobrepostos.
A forma funcional do nosso modelo, no entanto, agora está muito mais explícita e visível do que antes, o que nos permite inferencias mais intuitivas sobre a dinamica do PIB da Conchinchina diante de mudancas no PIB de Atlantida:
A maior vantagem deste modelo, no fim das contas, é finalmente nos proporcionar com uma dinamica cujo output explica, consistentemente, o ritmo de crescimento e o nível de PIB da Conchinchina pelo ritmo de crescimento e o nível de PIB de Atlantida.
Por aqui encerro esta série, onde ilustro o poder dos modelos ECM, sua relacao intrínseca com modelos ARDL, que regridem variáveis em nível, nao somente em primeiras diferencas. Através de diferentes etapas, compreendemos que há um pouco além da econometria do que aquilo que os livros-texto ensinam, e que muito pode ser desvendado com um pouco de exercício prático (obviamente nao tudo). Espero que tenham gostado, até a próxima.